Estou no exterior e demorei para perceber (e depois digerir) o artigo do físico Rogério Cezar de Cerqueira Leite na Folha de São Paulo (texto disponível aqui). O artigo já gerou uma certa controvérsia (ver aqui). Antes de discutir alguns pontos levantados pelo artigo, lamento que mais uma vez o professor Rogério tenha perdido a oportunidade de iniciar um debate de forma eficaz. A sua acidez tirou o foco dos muitos problemas que ele corretamente apontou (mas também de algumas besteiras escritas por ele).
Pois bem, selecionei para comentar alguns pontos do artigo. O primeiro refere-se à grande quantidade de publicações de baixo (ou nenhum) impacto, o que Rogério chama de "lixo acadêmico". Infelizmente, isso é uma verdade. A revista Veja recentemente tratou desse assunto. O aumento da produtividade científica do Brasil se deu principalmente no número desse tipo de publicação, tanto que o mesmo aumento não se observa no número de citações (esse sim um dos reflexos do impacto). O fato é que a nossa comunidade científica é medíocre. Isso é uma realidade decorrente de alguns fatores entre eles a má formação de recursos humanos e a existência de um sistema de ciência e tecnologia cujo principal componente (a universidade) valoriza o ensino e não a pesquisa.
Outro ponto levantado por Rogério é o alto custo da ciência praticada no Brasil, o qual associado à baixa produtividade de publicações de alta qualidade torna o sistema pouco eficiente. Cabe aqui valorizar a conduta dos governantes brasileiros nas últimas décadas. Esse alto dispêndio é produto de uma política de estado que valoriza a ciência e a tecnologia. A crítica mais importante refere-se a como esses recursos são distribuídos. Infelizmente, impera uma política pouco meritocrática de distribuição.
A sua crítica quanto ao investimento em regiões "ainda não desenvolvidas" do país é uma grande besteira. Se os EUA pensassem dessa forma, hoje não teríamos Stanford, MD Anderson e todo o sistema das UCs. Precisamos sim descentralizar mas de forma qualificada e criteriosa.
A questão da carreira universitária, extremamente pertinente, acaba sendo desqualificada pelo seu comentário que os concursos são "frequentemente falsificados". Ora, uma acusação genérica desse tipo não é aceitável. Se o professor Rogério sabe de casos assim (já que segundo ele são "frequentes"), que os denuncie às autoridades pertinentes. Participei como banca de vários concursos públicos e nunca presenciei nenhum tipo de "falsificação". A questão da carreira universitária é muito importante e merece uma discussão mais elaborada. Acho, por exemplo, que as mudanças feitas no ano passado foram um retrocesso (irei discutir isso em algum outro post no futuro). Um ponto que para mim parece óbvio é a questão da carga horária (de aula) exigida para todos os docentes das universidades públicas. Ela é a mesma independente da competência de uma dado docente em fazer pesquisa. Se um dado indivíduo é um bom pesquisador, ele(a) tem a mesma carga horária que alguém que não tem produtividade. Agora, se a mesma pessoa tem um cargo administrativo, em muitas universidades a sua carga horária é diminuída. Isso me parece um erro de avaliação e volta ao ponto que a prioridade nas universidades não é fazer pesquisa.
Esse é um assunto complexo e voltarei no futuro com outros posts relacionados.
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