segunda-feira, 18 de agosto de 2014

O sonho de Roberts e Sharp

  

   O ano de 1977 foi de certa forma mágico para as ciências da vida. Os métodos de sequenciamento de DNA, desenvolvidos independentemente por Fred Sanger e Wally Gilbert, começavam a revolucionar a biologia e a medicina. Dois jovens pesquisadores, Richard Roberts e Phil Sharp, também independentemente, fizeram uma descoberta que os colocou na história da ciência e chocou a comunidade científica. Os genes na maioria dos eucariotos eram interrompidos por sequências (chamadas de introns pelo mesmo Gilbert no ano seguinte) que eram retiradas ao nível do RNA, em um processo chamado de splicing. Roberts e Sharp ganharam o Nobel de Medicina em 1993 por esta descoberta.
  Hoje sabemos que praticamente todos os eucariotos têm ou tiveram introns e que a grande maioria dos genes em organismos mais complexos, como os mamíferos, apresentam uma variabilidade ao nível de RNA e proteína, causado pelo processo de splicing alternativo. A maquinaria responsável pela retiradas dos introns, o faz de forma variável dependendo de uma série de circunstâncias que são na maioria das vezes significativas do ponto de vista biológico. Ou seja, quase todos os fenômenos biológicos sofrem a influência do splicing alternativo. As doenças humanas não são exceções. Uma das mais conhecidas é a atrofia muscular espinhal (SMA, do inglês Spinal Muscular Atrophy). Mutações em um gene chamado de "survival of motor neuron 1" (SMN1), codificador de uma proteína pertencente à maquinaria celular responsável pela retirada dos introns, causa a doença, a mais frequente doença genética em crianças. A proteína mutada afeta o splicing de vários genes causando problemas aos neurônios motores da medula espinhal.
   Imagino que o sonho hipotético de Roberts e Sharp esteja relacionado à cura de doenças graças ao seu trabalho. A edição de 08 de Agosto da revista Science traz um artigo (disponível para assinantes aqui) onde Naryshkin e colegas mostram que algumas drogas são capazes de reverter o quadro de SMA em um modelo animal. As drogas funcionam restaurando a atividade de splicing deficiente nas células neuronais. O sonho de Roberts e Sharp está mais próximo da realidade.
  

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